terça-feira, 28 de agosto de 2012


A ARTE DE RECEBER

(Rabino Nilton Bonder)



Uma antiga lenda sobre a geografia da terra de Canaan compara seus dois mares, o mar da Galiléia, abundante em peixes e vida e, o mar Morto, um caldo de matéria sem vestígio algum de vida e se pergunta o porquê da diferença. A resposta, explica-se, encontra-se no fato de que o mar da Galiléia recebe através dos rios o descongelamento das neves do maciço do Golan mas, também deixa fluir de si as águas do rio Jordão que terminam no mar Morto. Este porém, por sua vez retém as águas e não as deixa seguir. Não sabe receber. Pois receber é estabelecer uma relação com a natureza ou o universo. Se experimentamos o recebimento como um fenômeno unilateral, que se limita a algo nos ser dado, separamo-nos gradativamente da troca que representa, em última instância vida. O mar Morto é mar como seu irmão da Galiléia mas, desprovido da vitalidade sutil que é produto de um recebimento que se completa ao deixar fluir de si e propagar-se pela cadeia da vida. Saber receber significa, em outras palavras, ter a capacidade de estabelecer um processo de troca com o universo circundante que nos inclua na corrente ecológica assim formada.
Toda a dor, angústia e ansiedade da rede "receptiva" da vida, advém de problemas de recebimento. Tal qual o mar Morto, muitas vezes perdemos o equilíbrio entre as águas doces e salgadas e surge a anomalia, o excesso que não flui. O receptáculo que não deixa fluir sofre e, gradativamente, se transforma num mar de lágrimas.

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